Sair das redes sociais é divino?

Lorde. Fonte: Divulgação.

Esta semana, a estrela pop Lorde - nascida Ella Yelich-O'Connor - revelou o que afirma se tratar de uma das melhores decisões de sua vida: deletou todos os seus posts no Instagram. Exceto um que promove seu próximo álbum, "Solar Power", e dois outros. Além disso, com 7,2 milhões de seguidores no Twitter, não tem um único tuíte (post) nessa rede social. 

Tal prática - de abandonar todas ou quase todas as redes sociais, ou postar com menos regularidade - vem sendo adotada por muita gente "sufocada de egos", seu próprio e dos outros. É gente cansada, decepcionada, com "sede de vida real" e privacidade.

Lorde. Fonte: Divulgação

Agora me sinto livre, em vez de receber informações o dia todo. 

          - Lorde 

Estou pensando nos efeitos que as redes sociais podem provocar sobre a população. O Brasil, sabe-se, é um dos países que mais utilizam redes sociais: nelas, muitas vezes se criam personagens - intencionalmente ou não. Uma persona digital acaba sendo desenvolvida, e o quanto ela tem da pessoa "real", offline, baseado no que se fala ou mostra na Internet, talvez nem a(o) autora(autor) da personagem digital saiba... Ou, talvez, faça tudo milimetricamente, como no caso dos influencers digitais ou de qualquer pessoa que use as redes sociais como fortes propulsoras de sua carreira, notadamente artistas, atores, cantores e escritores; para eles, as redes sociais são essenciais, assim como curtidas, seguidores e engajamento do seu público-alvo.

Porém, apesar dos filtros - literais, nas fotos e vídeos, e na vida -, muitas vezes as redes sociais servem exatamente para mostrar o lado puro de "gente como a gente", das celebridades ou de pessoas que tenham coisas interessantes a expor: seu dia a dia, bastidores, pensamentos (quase sempre, é verdade, selecionados, em maior ou menor grau), luta por minorias, debates saudáveis, embora muitos tomados de fúria, amparados pela proteção da tela e a soberba de poder ser quem se quer ser na rede.

Hoje, qualquer um pode ser um digital influencer, e muita gente tem investido nisso, com cursos, lives para criar um público assíduo, propaganda de marcas, ideias e do seu trabalho... A maioria acaba se decepcionando - a concorrência é muita. Tilintam os "mitos" de enriquecer fácil, o glamour que cobre todo o esforço para sobressair, a obsessão e competição por likes, seguidores e comentários elogiosos... É muito bom se sentir um pouco "semideus", não é mesmo? Mas, muitas vezes maçante, exaustivo.

Antes as redes sociais não fossem uma faca de dois gumes... e acabem levando muitos de nós a uma busca incessante de ser vista(o), aplaudida(o), o que, por sua vez, pode gerar um esvaziamento de "vida real", de si mesma(o), de amizades reais, de autoestima real. É comum estar o tempo inteiro cuidando da própria presença digital, de sua vitrine, seu buraco na fechadura - o grande buffet da existência humana, recortes das redes sociais. Sobre as mesas de conversas com pessoas de carne e osso, estamos sempre "ligados" ao mundo digital - um tipo de Alice no País das Maravilhas. 

Não quero aqui fazer nenhum julgamento, senão expor um enfoque de como a Era Digital, a Modernidade Líquida que escorre pelos dedos: as coisas são criadas, mostradas, e logo esquecidas, editáveis, mutáveis, fugazes, até os relacionamentos. A Era da Informação nos deixa a todos atordoados com a quantidade de dados absorvidos diariamente - praticamente a mesma quantidade que uma pessoa normal na Idade Média recebia em toda a sua vida.   

Enfim, uma sugestão: dê mais tempo à vida offline (caso não seja parte de sua profissão aparecer nelas com muita frequência). Não faça questão de mostrar tudo a todos, o que é desconfortável e até perigoso: "Não grite sua felicidade, a inveja tem sono leve", diz o ditado; ou: "Cão que late, não morde". Para que gritar, se se pode, na intimidade, sorrir, ser feliz, ter e ser? Ir à academia, a um lugar turístico, a um encontro com uma(um) amiga(o) sem ficar postando fotos e vídeos - quase sempre editados - enquanto não vive o momento. Muita gente tem morrido ao tentar tirar uma bela selfie!

A verdade é que acabamos absorvendo uma suposta - e certamente enganosa, visto que todos temos nossos problemas - vida perfeita de muita gente. E passando essa ideia, muitas vezes, ao fortalecer nosso ego. Somos pessoas filtradas, literalmente, cada vez mais! Até que nos olhemos no espelho (sem o celular e sem filtros), ou nos demos conta da conta bancária que temos de verdade, não que parecemos ter... 

Mais uma vez: é importante ter alguma presença digital, especialmente se você precisa de contatos no trabalho, por exemplo; mas tente dar mais tempo a si mesma(o), à vida em família, com seu cônjuge, sua(seu) namorada(o), seus cachorros, aproveite mais as viagens, a academia, se puder, sem transformá-los em um estúdio de exibição pessoal. Você é uma pessoa, muito além de imagens e falas digitais.

Redes sociais unem pessoas e trazem muita informação útil - e falsa -, apesar do ódio e das decepções. O segredo é fazer tudo com moderação, mesmo no caso de você ser digital influencer precisa ter um cronograma organizado para postar, ou vai se ver enredada(o) nos tentáculos de uma busca desenfreada pela fama e também do burnout, que é excesso de trabalho e de pensamento! A informação não para de circular nas máquinas, mas não somos máquinas!

Talvez, como a cantora Lorde, você no fundo deseje excluir suas redes sociais e conquistar maior paz interior, ter mais discrição e receber menos julgamentos. Talvez elas tenham se tornando suas algemas. No futuro, tenderemos a "debandar" das redes sociais, cansados de tanta exposição? Não sei. Sei que elas, as redes sociais, vivem mudando, como nós mesmos nesta época pós-moderna em que tudo gira e gira e gira e não para, aumentando casos de depressão, ansiedade, e - pasme - solidão, mesmo com tantas possibilidades de conexão. Contato não é conexão!

Pense em como as redes sociais têm afetado a sua vida, que imagem você tem passado em cada uma delas, se alguma poderia ser excluída, ou até incluída em sua vida, se está engajado com a "turma do ódio", se lhe está sendo tomado tempo precioso. Se a imagem que você passa é condizente com você - ou com o que você precisa passar. 

E principalmente: acrescente à vida das pessoas na Internet, de estrelas vazias o mundo digital - e offline - está cheio!

Até breve! 


Comentários

  1. Parabéns, Este post está muito bom, com uma percepção realista dos fatos atuais!

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