A geração em que todo mundo tem razão, e "tá tudo bem"

 


Se esperávamos que a pandemia, e os confrontos políticos entre Extrema Direita e Extrema Esquerda - que julgam "intermediários" ou alternativos pessoas fracas em cima do muro, muitas vezes -, fossem mudar nós brasileiros para melhor, erramos. Talvez não seja só no Brasil que as coisas estão à deriva, mas posso falar mais do país onde vivo. É claro, é só uma opinião, antes que me cancelem, como se tornou moda na terra brasilis

Após confrontos políticos, ideológicos e ético/religiosos (que persistem) e a pandemia, não ficamos mais humanitários. Mais compreensivos. Mais resilientes. Mais reflexivos. Ao contrário. Parece que o caos despertou ainda mais o caos da natureza humana coletiva, despertou "monstros", frustrações, ódios, revoltas, inexorabilidades. Os maiores estilhaços desta situação moral e eticamente crítica do Brasil podem ser vistos nas redes sociais. Ali, as pessoas podem se esconder atrás de telas, avatares, grupos de apoio, uma vida editada com opiniões pinçadas e carimbadas na testa de quem discorda, principalmente. "E tá tudo bem", como é quase obrigatório dizer hoje em dia. 

Mas não está.

O negócio extrapolou faz tempo para o mundo offline - que, hoje, raramente se desconecta por completo das redes. Famílias e casais brigando, amizades de anos desfeitas. Por política, opiniões, discordâncias. Tudo é motivo de "mimimi". Embora algumas coisas sejam motivo de discussão, respeitosa e argumentativa, sem ofensas pessoais. Pena que muitas destas coisas, ou destes assuntos, estejam esquecidos, em detrimento de "briguinhas ideológicas", disputas de ego, fórmulas prontas para o amor, a amizade, a família, o estilo de vida ideal ou da moda. 

Se temos uma geração mais saudável fisicamente, pelo cuidado com alimentos e a prática de exercícios físicos, além da informação, temos, igualmente, apesar da informação disponível, uma geração menos saudável mentalmente. Menos resiliente. Menos ponderada. Mais impulsiva. Menos equilibrada. Mais cheia de ódio, cancelamentos, gente querendo ditar o que é verdade de acordo com suas lentes internas, gente sem saber o que quer, mas muito certas do que e de quem não querem, sem saber exatamente por quê.

Não que eu esteja me excluindo disso.

Tampouco, quero ser "a rabugenta que sempre acha que no meu tempo era melhor". Eu vi a Internet nascer, embora ainda criança. Vi ela se modificar, passarmos da Era Digital para a Era da Inteligência Artificial (IA). Vi Orkut, a grande revolução, embora breve, Facebook, Instagram, Twitter (agora X), TikTok. E, em meio a tudo isso, redes sociais que desapareceram, em que muita gente fazia sucesso, como o Fotolog e os blogs íntimos, que hoje são mais voltados para negócios ou temas específicos. 

Não me pergunte a solução para este estremecimento no Brasil - e provavelmente, em menor escala, no mundo. Estou pensando. Resistindo. Adaptando-me, que é como a Lei de Darwin nos manda fazer se quisermos prosseguir. A roda gira cada vez mais rápido, você tem de fazer muito mais que o mínimo no trabalho, a concorrência aumenta em questão de horas, tem de saber tudo o que puder em qualquer lugar onde estiver, estamos esgotados, cansados, perdidos e... narcisistas.

Narcisismo não é qualidade. É diferente de amor-próprio. Narcisismo é sempre desprezo ao outro em detrimento de uma supervalorização do "eu". Isso não parece dar muito certo. Sempre queremos mais - curtidas, aplausos, endeusamento. Os "semideuses" de Fernando Pessoa nunca estiveram tão em voga. "Onde é que há gente neste mundo?". Gente que escute, tente, ao menos tente compreender. Não se ache sempre dona da razão, ainda que finja concordar com uma "reação bovina" em ar de superioridade.

E, se você acha que eu tô exagerando, explique a explosão, especialmente no nosso país, dos casos de ansiedade, depressão, síndrome do pânico, suicídio. O caos político, o caos do povo. Em uma democracia, o governo é o reflexo do povo, diz o ditado. 

De qualquer modo, reconhecer que estamos um tanto perdidos, frustrados e frustrantes, já é um passo. Os próximos, só Deus sabe. Ou talvez as respostas estejam dentro de cada um de nós. Lá, onde você tem medo de tocar porque sabe que vai ter de se enfrentar, e parar de projetar nos outros o que não aceita em si mesmo. Lá, onde você "se esqueceu" um dia. Lá, onde você poderá provavelmente descansar, talvez após uma árdua batalha com o próprio ego e as próprias convicções.  

E tá tudo bem.

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